Condições mínimas de trabalho. Ensino totalmente alterado. Luto pela morte de amigos e parentes em decorrência da Covid-19. Além do enlutamento pela perda da sala de aula. Um adoecimento multifatorial, acentuado durante a pandemia, atinge professores e outros profissionais da educação. Nos últimos dois meses, mais de 1,2 mil buscaram apoio emocional no projeto Sala de Afetos, voltado para escuta dos profissionais de todo o Brasil. Só no Ceará foram mais de 800.
Conforme Renê Dinelli, cearense idealizador da iniciativa, a maioria das pessoas vem da rede pública. Os encontros são online e gratuitos. Não é uma psicoterapia. “Trata-se de um acolhimento a um grupo de professores e outros profissionais da educação, onde possam construir rede de cuidado entre eles. Para além disso, que construam dentro da escola redes de apoio, espaços onde falem das emoções e sentimentos, para de alguma forma se sentirem preparados”, completa o psicólogo educacional e psicoterapeuta.
Nesta segunda-feira, 10, a professora Elizabeth Dias Martins, da Universidade Federal do Ceará (UFC), retoma às aulas remotas para finalizar o semestre 2020.1. Os programas das disciplinas ainda não estão fechados. “Eu e muitos colegas sentimos que fomos jogados a uma realidade que não tínhamos o mínimo de conhecimento e não tivemos o apoio emocional”.
Assim como ela, 83% dos professores brasileiros se sentem nada ou pouco preparados para o ensino remoto, conforme pesquisa do Instituto Península com quase 8 mil docentes, divulgada em maio. O estudo mostra ainda que 75% dos educadores não receberam nenhum suporte emocional das escolas.
Considerada do grupo de risco, a professora do Programa de Pós-graduação em Letras/Literatura Comparada reside com outros pessoas na mesma condição. Elizabeth perdeu amigos, alunos e parentes. “A gente não tem hora para trabalhar. Eu trabalho pela manhã, à tarde, à noite e entro pela madrugada”, relata.
De férias, a professora de geografia da rede municipal, Rosa Sérvio Chaves, 34, adaptará o conteúdo das turmas de três escolas onde ensina. “A gente trabalha muito mais em casa do que nas aulas presenciais. Eu tive muitos sintomas físicos, como enxaqueca, pela exposição o dia inteiro à tela do computador e celular, e muita dor no corpo pela postura”, lembra.
A professora revela ainda preocupação com possível retorno das classes presenciais em setembro. Ela acredita que as estruturas das unidades não estão aptas, não há profissionais suficientes para higienizar os espaços e o plano em elaboração para a retomada não dará conta da biossegurança da comunidade escolar.
Da rede estadual, Cícera Barbosa, 35, leciona história em três escolas no Bom Jardim, e lembra das primeiras alterações da rotina. “Eu chorei muito porque eu tinha de refazer alguns serviços. Eram outras mudanças dentro de um contexto de várias mudanças”, comenta.
A historiadora lembra que teve um encontro presencial de área entre alguns professores, mas não pode ir. Ela conta que participou por videochamada, mas só chorou durante a conversa. “Em uma das escolas, a gestão estava muito preocupada. Ao mesmo tempo, o trabalho em casa é muito solitário. Acordar cedo e ainda não ter nenhum estudante online. Tenho insônia, crises de ansiedade, crise de pânico”, relata.
Com informações do o povo